Olá povo do fetiche, todos bem?
Hoje eu venho provocativa …
Quero convidar vocês para, junto comigo, pensarmos o quão verdade é a frase “o combinado não custa caro” dentro do universo BDSM.
Então já sabem né? Cafezinho na mão e bora colocar o cérebro para pensar!
Quem acompanha meu trabalho no Instagram, deve ter visto que há 3 semanas eu bati um papo com a minha amiga, também redatora aqui do site, Hacking Sex, sobre qual a cidade de chave que faz um fetiche se tornar transtorno.
Se você ainda não assistiu, chega lá no perfil do @darkroomclaoficial e dá uma olhadinha na aba dos vídeos, você não vai se arrepender.
Pois bem, temos um “mote” dentro da nossa comunidade que, um fetiche, desde que haja um consenso entre as duas partes, está com a porteira aberta para a felicidade, afinal, cumpriu o “consensual” do BDSM.
Se estivéssemos num vídeo, agora seria a hora que eu pararia o vídeo e aquele barulhinho de fita rebobinando soaria e eu voltaria na cena te perguntando “será mesmo? Vamos olhar mais de perto ….”
Imaginem que eu, Sra Storm, Top e você, leitor que está me agraciando com a sua atenção nesse momento, está na posição de bottom, e nós estamos negociando.
Você então me diz que tem fetiches em coisas “muito fora do padrão”. Eu te respondo que “poucas coisas podem me assustar no que diz respeito aos fetiches” (o que de fato é verdade!) e você então me diz “eu tenho fetiche em mutilação e meu maior desejo é ter parte xis do meu corpo mutilado”. Para sua surpresa, eu vou dizer “ok! Podemos fazer” …
E antes de continuarmos, quero só ressaltar que ninguém precisa me achar mais maluquita do que já sou tá? Mutilação (dependendo da característica) pode ser englobada em modificações corporais! E tá tudo bem viu? Não é crime! E pode ser feito num contexto BDSM também!
Voltemos à nossa Ds…
A gente negocia, fecha nosso acordo e seguimos felizes até que, chega o belo dia da realização do seu fetiche maior, e eu faço uma mutilação em você! Que sai feliz e contente da sessão!
Eu, que não sou nenhuma abusadora, acompanho todo o processo de cicatrização e tudo continua na santa paz na nossa Dszinha.
De repente, por conta da sua mutilação, você bottom, perde o emprego. Emprego esse, que é a sua única fonte de renda!
Passado alguns meses, percebemos que a sua mutilação, continua sendo motivo de impossibilidade para que você se recoloque no mercado. e sua situação financeira começa a ficar bastante precária, fazendo com que você comece a se endividar, inclusive com parentes.
Drástico não é mesmo? Então pare a cena aqui, e vamos para um exemplo, menos “drástico”!
Imagine que eu e você temos uma Ds e ambos gostamos de castidade. E você mostra o desejo de viver em castidade por longos períodos. Eu topo!
Acontece que, na vida baunilha, você tem uma parceria com uma pessoa que não se incomoda que você viva os seus fetiches, uma vez que essa pessoa não é interessada no BDSM mas, é esclarecida o suficiente, para concordar em manter o relacionamento entre vocês, mesmo você tendo sua Ds comigo.
Essa pessoa não perdeu o amor, interesse e muito menos o tesão em você, muito pelo contrário, a vida sexual de vocês, continua bem boa para os padrões do acordo de vocês.
Só que agora, você está em castidade comigo! Ou seja, você não poderá transar com a sua parceira de forma penetrativa, como é do interesse dessa outra pessoa.
Menos drástico né? Mas tão imbróglio quanto, não é mesmo?
Pois bem, o motivo de eu ter proposto esses dois exemplos para vocês, é somente para mostrar o quão fraco o argumento “o combinado não custa caro” dentro do BDSM!
Eu, Sra Storm, sigo uma linha de pensamento dentro do BDSM que acredito, o SÃO, do São, Seguro é Consensual, PRECISA ser repensado e expandido seu entendimento.
Nenhum fetiche deveria ser considerado são quando ele afetar diretamente a sua funcionalidade, ou a funcionalidade de pessoas que tenham vínculo direto com você.
Acredito que a nossa comunidade já tenha maturidade o suficiente para colocar a mãozinha na consciência e entender que, essa coisa de “viver o fetiche desenfreadamente, custe o que custar” é um comportamento que passa longe, muito longe, de conceitos como sanidade e segurança.
Precisamos nos tornar maduros e responsáveis, para que o mundo baunilha passe, a quem sabe, nos olhar com olhos menos recriminatórios.
Volte um segundo lá no exemplo 01, e imagine o impacto que você estaria gerando na sua vida, as vezes impactando também a sua família, por causa da satisfação desse desejo.
Volte ao exemplo 02, e imagine o impacto negativo que a sua relação estaria sofrendo, somente porque você quer viver o seu fetiche de castidade para todo o sempre.
Agora imagine quais os olhos que terceiros colocam no BDSM quando deparam com pessoas que estão prejudicando suas vidas por causa do fetiche.
Lutamos tanto para não sermos considerados doentes, mas continuamos perpetuando comportamentos que nos colocam nessa posição.
“Ah Sra Storm, deixa de ser conservadora. Ninguém tem nada a ver com o meu fetiche! Ninguém tem nada a ver com a minha vida! Eu não devo nada para ninguém!”
Então meu pequeno gafanhoto, se você já passou dos 18 anos, não faz sentido nenhum você continuar acreditando nesse “estilo de vida” onde o que acontece na sua vida não impacta na sociedade, e vice e versa!
Já ouviu falar em “pacto social”?
Sabe o motivo de estarmos todos emputecidos com as pessoas negacionistas que não querem tomar a vacina do SarsCovid19?
Pois então!
Se esse pensamento/argumento adolescente do “ninguém se mete na minha vida” fosse válido, ninguém estaria preocupado com quem não quer tomar vacina! Afinal, não tomar vacina é um direito do cidadão.
Porém o exercício desse direito, afeta diretamente a nossa vida pois, com um monte de gente não se vacinando, nós, além de nunca ganharmos essa briga, continuaremos sempre com a nossa vida em riscos contaminação!
Então, deixa a birra adolescente do lado de fora da sala, porque já somos todos bem grandinhos, e faz parte da vida adulta, a consciência e responsabilidade pelos nossos atos.
Nosso direito vai, até onde começa o direito do outro e ninguém, absolutamente ninguém, tem o direito de colocar outra existência em perigo, precariedade ou sofrimento, de forma deliberada, sem que seja responsabilizado por isso.
E antes que você use o argumento que estou fazendo kink shaming, eu vou pedir delicadamente que você volte, e leia o texto mais uma vez.
Você perceberá que não estou fazendo shaming de fetiche nenhum, mas sim, analisando as consequências dos nossos atos enquanto fetichistas!
A comunidade precisa urgentemente criar cultura de responsabilidade, para que o SSC saía desse limbo de entendimento que ele vive, e se torne uma ferramenta verdadeiramente efetiva de minimização dos riscos!
E contrariando todas as normas de construção de textos, esse texto não terá um fechamento da ideia, pois quero deixar a questão para todos vocês pensarem.
Quero que vocês analisem realmente se, dentro de um conceito de preservação de funcionalidade para que o fetiche não se torne um transtorno, faz sentido a gente ainda repetir o mote de que o “combinado não custa caro” dentro do BDSM?
Se cuidem, e até sexta quando voltarei falando um pouquinho sobre servidão doméstica.
Hidratem-se
Masturbem-se
E tenham uma boa semana
Abraços
Sra Storm
AUTORA
SRA STORM
Terapeuta sexual e praticante de BDSM. Sádica e voyeur assumida, suas práticas preferidas são as de caráter mais psicológico porém, se encanta também por práticas como Wax Play, Flogging, Branding, Castidade e Inversão e algumas outras pequenas perversões!
Instagram: @darkroomcla com conteúdo instrutivo da subcultura Kink e BDSM.
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Uma resposta
Texto muito interessante e importante! Vivemos numa sociedade real, em que temos obrigações e responsabilidades. Não há como nos isolarmos disso, e negar esta condição é algo extremamente pueril. Claro, cada um é dono de seus desejos mas isso não significa que estamos autorizados a fazer absolutamente tudo. Na verdade até somos livres em nossas ações, mas somos prisioneiros das consequências destas – don´t do the crime if you can´t do the time! E não há nada de errado nisso! Podemos conciliar nossas vidas baunilhas com a realização de nossos desejos kink, basta usar o bom senso…