HISTÓRIA DA CULTURA LEATHER

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A COMUNIDADE LEATHER

A configuração da cultura Leather se dá em torno de uma forma muito específica de se vestir e também de se relacionar sexualmente.

Todos os detalhes são importantes para a composição de um adepto da cultura Leather, os sapatos, os harnesses, os coletes, as jaquetas, as luvas e por aí vai, nada pode ser esquecido! A beleza do Leather, mora nos detalhes …

Quando alguém se veste em “couro”, pressupõem-se que essa pessoa esteja consciente da mensagem que está passando, pois, vestir-se em couro é destacar também, e inclusive, suas preferências na esfera erótica, uma vez que, o couro expressa apropriação de forma e determinação sexual, independência, poder, fetichismo e, algumas vezes, até masoquismo.

A cultura Leather, embora tenha sua raiz na comunidade gay masculina, não é excludente, ou seja, lésbicas, bissexuais, pansexuais e até mesmo mulheres héteros fetichistas se valem do couro como forma de identidade e expressão.

HISTÓRIA DA CULTURA LEATHER

A cultura Leather existe desde o fim da 2ª Guerra Mundial. Lá pelos fins de 1940 teve forte representação com os movimentos de motoclubes e, foram esses mesmos motoclubes que serviram de inspiração para a criação bares Leathers gays masculinos.

Foi nessa época inclusive, que muitos lugares que abrigaram a cultura nasceram, por exemplo, Satyrs (Los Angeles, 1954), Oedipus (Los Angeles, 1958), Waterlocks (São Francisco, 1958) e Gold Coast (Chicago, 1958).

The Pioneers of the Leather and Biker Scene in Los Angeles
Mural from Gold Coast Bar Chicago
ChicagoNow – Images of Chicago Leather in the 1970s & 1980s – Bitter Old Queen

Em 1964, um artigo bastante preconceituoso publicado na revista “Life” chamou a atenção do público para a comunidade Leather e, em específico para um bar em especial, o Tool Box que ficava em São Francisco. Tool Box na época, sofreu vários ataques de grupos homofóbicos e, especula-se até hoje, que o artigo teve o real propósito de incitar o ódio contra esse bar porém, como nada nunca se provou, a especulação perdura até os dias de hoje.

26 de Junho de 1964, edição da revista LIFE. A legenda diz: “Um bar de São Francisco dirigido por e para homossexuais está lotado de clientes que usam jaquetas de couro, fazem um show de masculinidade e desprezam membros efeminados no mundo. O mural mostra domens de couro”. Bill Eppridge – Revista LIFE

Independente do recorte preconceituoso à comunidade gay Leather, não se pode negar sua influência e importância na moda e na cultura da época. Correntes e couro e/ou couro e jeans foram popularizados por James Dean, no cinema e, Rob Halford, vocalista do Judas Priest, na música. Rob inclusive, em 1978, fez questão de pontuar aos repórteres da época que o questionaram sobre seu visual, que sua inspiração advinha da cultura gay Leather. Talvez por isso, até hoje a gente ainda veja o povo do metal todo trabalhado no couro!

THE EVOLUTION OF JUDAS PRIEST’S ROB HALFORD | Judas priest

A comunidade Leather, já foi também por si só, reconhecida como a mais antiga subcultura dentro da comunidade LGBTQI+ e sempre trouxe consigo, uma variedade de tradições. Essas tradições obviamente variam de região para região em que a cultura está inserida logo, não seria espanto nenhum, portanto, dizer que, assim como o BDSM, na comunidade Leather também existe muito debate no que diz respeito à “romantização” do estilo de vida.

Não podemos negar, porém que, a popularização da comunidade Leather associada ao BDSM foi um dos fatores que contribuíram para as mudanças da subcultura em si, gerando todos os debates em torno da questão. Por incrível que pareça, também existe na comunidade Leather a discussão e separação dos da “velha” e da “nova” guarda dos Leathers. Essa discussão parece ser infinita e, a mim não espanta à semelhança que temos das nossas discussões aqui no BDSM.

Reconhecer-se Leather, assim como reconhecer-se como integrante de qualquer dissidência, é um processo muito íntimo, pessoal e único. Algumas pessoas relatam períodos de silêncio e introspecção para entendimento de si mesmo, enquanto outras, simplesmente se abrem e dão vazão, abraçando esse lado de suas personalidades sem maiores problemas ou dificuldades.

O que precisa ficar bastante claro é que, quando falamos de Leather não estamos necessariamente falando de BDSM!

Embora as duas vias se cruzem, reconhecer-se Leather não necessariamente torna a pessoa adepta ao BDSM, ou seja, nem todo Leather eh Top, nem todo Leather é Dom, nem todo Leather é sádico.

Leather e BDSM são duas formas poderosíssimas de expressão do erotismo e de poder, que podem sim andar de mãos dadas, mas não é uma obrigação. Muitas pessoas que se reconhecem Leathers, adoram viver a experiência sensorial do couro mas não se enxergam na verticalidade de uma relação BDSM!

E está tudo bem!

O BDSM nasceu sim dentro da comunidade Leather mas não fez disso o DNA de todos os participantes. Se você é Leather e BDSMer, legal! Se você é Leather e fetichista, legal também! E se você é BDSMer e não é Leather, está tudo bem também! Tem espaço para todo mundo!

A relação “casadinha” entre BDSM e a comunidade Leather se efetivou quando em 1979 criou-se o Mr Leather Contest que dai sim agrupou os Leather e BDSMers num mesmo espaço e evento, porém, diferente do que muitos pensam também, para efeitos de concurso:

1 – o participante não precisa necessariamente ser Top no BDSM. Como por exemplo Miguel Roldan, que foi um dos candidatos a Mr Leather Italy 2020 que, no BDSM, se reconhece na posição de bottom;

2 – o participante não precisa ser do sexo masculino, como por exemplo, a linda Karin West que foi eleita Miss Leather Holanda 2020.

A MULHER NA COMUNIDADE LEATHER

Quando se fala da presença feminina na comunidade Leather BDSMer, não se pode deixar de falar sobre Pat Califia que, 1978, fundou na Califórnia, o primeiro “lesbian SM Club”, o Samois e sua participação foi muito significativa tanto para o movimento Leather como para a comunidade BDSM. Ela foi precursora de muito do que temos hoje e, depois dela e apoiados nela, que lá pelos idos dos anos 80, grupos como G.O.D., Wicked Women e Leather and Lace ganharam voz e notoriedade, tanto em Sidney como Los Angeles e Nova York.

The Samois was a lesbian SM support group founded in 1978 by former members of Cardea, Gayle Rubin and Pat Califia, and 16 other women in San Francisco. FOTO BY @leatherarchives

Leather and Lace inclusive, é reconhecido como um dos clubes Leathers de “velha guarda” contando inclusive com, “código de conduta” e “uniforme”. Uniforme esse, que somente é permitido o uso às participantes que ganharem, através da honra, o direito de usá-los.

Voltando à cena masculina, por razões que hoje eu ainda não consigo explicar, na cena Leather americana, a faixa etária comum está ali na casa dos 40+ porém, isso é uma característica bastante particular da América. Nos demais países, que também possuem uma comunidade Leather expressiva, a faixa etária é bem mais baixa.

Essa “jovialidade” do movimento é também uma das responsáveis pela popularização e entrega de conhecimento da comunidade Leather ao grande público, fazendo assim com que o preconceito diminua, o que é, por si só, uma boa coisa!

AMÉRICA E EUROPA

América e Europa também, sediam até hoje, a semana “Leather Pride”. Chicago, Washington, Amsterdã e Berlim, durante um final de semana, recebem Leathers de todo o mundo e proporcionam vários tipos de eventos que envolvem desde pequenas lojas que comercializam acessórios e roupas, palestras, workshops, cenas públicas, consultoria jurídica, até a Marcha Leather em si.

Leather Walk – San Francisco 2015
Leather Walk – San Francisco 2015

LEATHER ARCHIVES & MUSEUM

Atualmente, para aqueles que se interessam e tem a possibilidade, temos o Museu do Arquivo Leather – LEATHER ARCHIVES & MUSEUM, em Chicago, que se dedica a compilar, preservar e manter material gráfico e fotográfico que não só conta a história, mas também traz conhecimento para qualquer pessoa que se interesse pelo universo Leather, kink e BDSM.

LEATHER ARCHIVES & MUSEUM -CHICAGO

Inclusive, se assim como eu, você gosta de ler e estudar, minha super dica é a biblioteca do Leather Museum que, além de ter muito conteúdo disponível, também nos possibilita o cadastro on line e, mediante um pequena anualidade, o acesso aos textos digitalizados, é infinito! Foi dessa biblioteca inclusive que eu me alimentei para trazer esse texto para vocês!

BRASIL – A CENA NACIONAL

Falando agora um pouquinho sobre o recorte nacional, a comunidade Leather existe há considerável tempo, porém, costumava se encontrar sem um grande número de adeptos. Foi só em 2017, quando o Bar Eagle SP tomou pra si a responsabilidade é organizou o 1º Concurso Mister Leather Brasil, e foi então, que a comunidade tomou corpo.

Neste ano, Dom Barbudo conseguiu vencer as 3 etapas do concurso e se tornou então, nosso 1º Mr Leather Brasil. Título esse, que lhe carimbou o passaporte para nos representar no Mundial, trazendo para o Brasil a 10ª colocação!

Primeiro Concurso Mr Leather Brasil – Bar Eagle São Paulo em 11/03/2017
Dom Barbudo – Mr Leather Brasil 2017

Para aqueles que não são envolvidos com a comunidade, talvez não consigam mensurar a importância que é, para a cena Leather Brasileira, a primeira vez que figurou no concurso Mundial, já arrebatou um 10º lugar! Isso é grande!

IML – 2017

Após sua eleição, Dom Barbudo vem representando com excelência a comunidade Leather para públicos gays ou não, BDSMers ou não e, juntamente com os demais Mr Leathers eleitos, que vieram depois dele, Dom PC em 2018 e Dom Papai em 2019, o trabalho continua, firme e forte!

Dom PC – Mister Leather Brasil 2018
Dom Papai – Mr Leather Brasil 2019

Devido ao momento delicado que vivemos, o concurso de 2020 foi temporariamente suspenso.

Como BDSMer, eu somente agradeço à comunidade Leather por ter nos abrigado desde sempre, e torço para que num futuro bem próximo, todos vivamos em plena harmonia e com nada de preconceitos.

A foto da postagem da capa é de uma das ediçõs do @jantarleather e o fotógrado foi o @calle.95fotografia

AUTORA: SRA STORM

Chef de cozinha e empreendedora da área de alimentos e no BDSM Top dedicada às práticas de Wax Play, Flogging, Branding, Castidade e Inversão e algumas outras pequenas perversões!Instagram: @darkroomcla com conteúdo instrutivo da subcultura Kink e BDSM.

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