Antes de começar, deixa eu fazer uma pergunta? Como você imagina um top? Alto, másculo, viril, com uma barba de respeito como a do nosso Barbudo? Precisa ser bem dotado? Ativo? Com pelos ou sem? E a voz? Como a voz tem que ser? E no caso de uma top mulher? Bonita, tenho certeza! Sexy, com boas roupas, sempre em um salto alto. O cabelo dela? Maquiada sim ou sim? O boleto da smart fit pago, com certeza?

Quantas vezes nós reproduzimos diversos estereótipos dentro da nossa cultura BDSM. É algo (quase) inconsciente que aqui vou chamar de automático, ou seja, que a gente não tem consciência do que está acontecendo e reproduzimos porque estamos acostumados a ver e reviver. Nossas crenças sobre o contexto do BDSM.

Não sejamos moralistas, todos nós temos em maior ou menor grau, crenças acerca do nosso papel no BDSM assim como no BDSM em geral. E muitas dessas crenças vem da nossa vida baunilha, muitas vezes baseadas dentro de um padrão de vida que conhecemos. Já discutimos isso antes na origem dos fetiches, nos textos sobre crenças sociais e no texto sobre persona.

Eu juro que eu não analiso pessoas 24h por dia, mas é automático que, quando eu converso com pessoas que se dizem dominadoras ou submissas, ou pelo menos que dizem que praticam BDSM, qual é a função daquele comportamento. Skinner, lá na década de 1940 enquanto trabalhava no que veio a ser chamado behaviorismo radical, já dizia que todo comportamento tem uma função. Algumas décadas depois, lá na década de 1960 Aaron Beck fundador da terapia cognitivo-comportamental, dizia que todo comportamento vinha sustentado de um pensamento e de uma emoção. E que todo pensamento tinha um significado. O nosso trabalho em psicoterapia acabou virando identificar qual que era a função e o significado desses pensamentos e desses comportamentos.

Toda vez que vejo um perfil, seja nos aplicativos de pegação, seja no twitter ou no Instagram eu percebo que, muito deles reproduzem estereótipos da vida baunilha. Quantos perfis que você conhece que tem fotos clássicas, preta e branca com uma mulher esguia, geralmente branca, ajoelhada aos pés de um homem de social , geralmente preto, com alguns acessórios, geralmente uma coleira ou chicote. Ah, esqueci de pontuar que, se a mulher não está nua, está com uma lingerie preta ou vermelho de renda, pois aquela do dia a dia não conta. No caso do BDSM gay, poucas coisas mudam: homens fortes, barbados em roupas de couro ou social com um menino, geralmente mais novo aos pés sem camisa ou com uma jockstrap.

E quando o que encontramos na realidade fogem desse ideal instagramável? Quando o top muitas vezes é sexualmente passivo ou quando a casa do top não e como o Studio do Dom Barbudo, cheio de acessórios, quando o top te recebe com uma camisa branca de algodão? Quando o bottom é acima do peso, o top é acima do peso, e mais baixo do que imaginamos ou, quando vamos fazer uma primeira experimentação de spanking não gostamos da sensação?

Sempre digo que o que destrói uma experiência, seja ela uma cena BDSM, seja ela uma vivência da vida real é a expectativa e a experiência que damos à ela. Quanto mais expectativas, mais alto elevamos aquela experiência. E quanto mais alto elevamos, maior é a queda. Mais a chance de nós frustramos. E acredite! Não conheço muitos adultos que saibam lidar com suas frustrações daquilo que eles mesmo imaginaram.

Para finalizar, quero deixar uma tarefa de casa para quando vocês forem se aventurar na próxima experiência: o quanto você está imaginando é real? O quanto isso que você está imaginando é distante da realidade? Eu sempre digo que, é muito melhor abaixarmos a expectativas e sermos surpreendidos com novidades do que planejarmos tudo e nós frustramos com aquilo que idealizamos e que só poderia acontecer em um filme Hollywoodiano.

Se persistirem os sintomas, procure o terapeuta mais próximo

AUTOR:

DR PSI

Psicólogo, especialista em terapia cognitivo-comportamental, psicopedagogia clínico e institucional e atualmente especializando em neurospicologia. Sempre fui interessado no mundo do BDSM, com a primeira experiência por volta dos 19 anos. Atualmente interessado em disseminar esta cultura em seus diferentes aspectos e as influências psicologias que estão atreladas.

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Uma resposta

  1. Difícil não criar cenários idealizados em nossa mente quando projetamos alguma situação. Talvez pelo desejo, e ainda por influência daquilo que assistimos em filmes ou internet. Nunca imaginamos cenas imperfeitas, e isso inclui as sensações e as pessoas que estão presentes naquela situação. Mas há que se ter cautela, para não se frustrar quando a fantasia se tornar real, porque a realidade nunca é igual – nela há pessoas “de verdade”, cheiros, sabores, dores e prazeres que podem ser agradáveis ou não. Penso que o mais importante é ter consciência disso tudo para que não haja uma idealização excessiva – afinal, nenhum de nós é perfeito e é muito mais provável que encontremos outras pessoas iguais.
    Quando comecei a me interessar pelo universo BDSM também tinha estas idealizações. Depois que conheci alguns Dons e Dommes mais baixos que eu, acima do peso ideal (assim como eu), com pouco cabelo, celulites, etc, assim como subs mais velhos, grisalhos, com rugas e acima do peso tentei desconstruir esta idealização em minha mente. E nenhuma destas características desabona qualquer uma destas pessoas!

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