Olá Danadinhos, vocês estão bem?
Hoje vou trazer um assunto que vem me incomodando há um tempo, e que retrata muito o que anda acontecendo na nossa comunidade ultimamente.
Vivemos épocas estranhas onde as polarizações estão cada dia mais fortes e inegáveis e, como o BDSM sempre responde exatamente de acordo com a comunidade a qual ele está inserido, fatalmente, por aqui não seria diferente!
Então, peço que vocês se acomodem e vamos falar um pouquinho sobre “viés de confirmação”
E para começar vou lhes propor um exercício:
Imagine que eu lhe proponha um jogo: diante de uma sequência de três números, você precisa tentar deduzir qual a regra que os rege e crie outras trincas para testar se a regra é válida.
A sequência é “2, 4, 6”.
Que outros grupos criaria?
E que regra você deduz?
Se você for como a maioria da população, você me dará sequências de “8, 10, 12” ou “26, 28, 30”. Suas trincas serão consideradas corretas e, encorajado pelo resultado, você ainda reforçará sua regra dizendo: “Três números pares”.
Pena que essa é a regra não necessariamente é essa!
A regra verdadeira não requer múltiplos de 2. Basta que os números estejam em ordem crescente!
E a partir desse momento, ou você refutará completamente o meu argumento, ou tenderá ao extremismo para justificar o seu. Mas muito provavelmente você não me olhará e dirá “é verdade, você tem razão, é somente um ordem de três números crescentes.”
Essa “pegadinha” foi criada pelo psicólogo britânico Peter Wason em 1960, para evidenciar o “viés de confirmação” que é a tendência de, uma vez adotada uma crença, só buscar exemplos que a confirmem.
No caso das trincas de números, bastaria propor uma sequência do tipo “3, 7, 9”, e vê-la ser declarada válida, para provar que a tese dos números pares é incorreta. Mas quase ninguém pensa nisso!
Vocês devem estar se perguntando: “mas o que isso tem a ver com BDSM Sra Storm? Perdeu o juízo?”
E aqui danadinhos eu lhes digo: “perdi nada!”
E é somente vocês pararem para pensar no que anda acontecendo no BDSM atualmente!
Querem um exemplo bem bobo? Ds Virtual!
Existe uma voz quase uníssona no BDSM que diz que “tudo bem viver uma Ds à Distância, o errado é pautar seu relacionamento numa pessoa que você nunca viu nem nunca verá na vida”.
Mas óbvio que, pra toda regra há uma exceção, e daí encontramos os perdidos pelos caminhos, aquelas pessoas que insistem em dizer que autoflagelo é BDSM! Que falta de compromisso com o aftercare é BDSM! Que a falta da verdade é BDSM!
Essas vozes acabam encontrando pessoas que vem para o lado de cá, sem nenhum tipo de conhecimento de como a banda toca, sem nenhuma vontade de estudar um tiquinho para se manter seguros e o que essas pessoas fazem? Dão eco àquelas vozes que endossam a virtualidade das relações!
E por quê?
Porque essas vozes confirmar uma série de coisas que essas pessoas trazem para o lado de cá como verdade!
Outro exemplo? Monogamia!
A monogamia é um regime jurídico matrimonial que prevê que os cônjuges se mantenham “monógamos” como “prova do amor da união”.
Puta besteirol!
A monogamia é nada mais do que um expediente jurídico para a manutenção da propriedade! Mas quase ninguém está preparado para essa conversa!
Voltando ao BDSM …
Nossas relações não são pautadas em contratos abrigados por guarda chuvas jurídicos pois, nossas práticas não são assim lá tão lícitas e, juridicamente, não existe regulamentação sobre objeto ilícito 🤷🏻♀.
Logo, nossos contratos não geram obrigações sucessórias, o que faz com que a “monogamia” não se faça necessária, não seja um item a ser compulsória à parte dominante.
Daí a pessoa vem pro lado cá buscando o que? Um marido! Uma esposa! E começa nesse momento a celeuma do “não aceito Top não monógamo” ou ainda “se o Top pode ser não monógamo, eu bottom também posso”. Essa última então, além da busca de viés de confirmação, traz consigo ainda uma total inobservância e respeito pelas “regras do jogo”. Por que, na minha opinião, uma pessoa que entra num estilo de relação vertical de Ds “exigindo” as mesmas características de uma relação “horizontal” de duas uma: ou não entende o conceito de verticalidade, ou não respeita mesmo as regras do jogo!
Até mesmo porque, nosso universo permite viver a verticalidade sem nos engajarmos numa Ds. Não quer o compromisso? Seja bottom, seja Top, se engajem nas avulsas e nas playspartners. Mas não tentem mudar a estrutura do jogo.
Atualmente, o que mais vemos são pessoas que dizem os maiores despautérios ganhando voz, não porque elas “entregam” um BDSM novo! Mas sim, porque elas confirmam os vieses das pessoas que por aqui chegam, cheias de conceitos errôneos, já pré concebidos do BDSM.
Agora vocês podem me perguntar: “ah Sra Storm, mas o que isso prejudica?” E eu lhes digo: prejudica toda a estrutura do jogo! Só isso!
A partir do momento que as pessoas chegam desse lado, sem querer entender realmente como tudo se desenvolve no BDSM, e buscam somente as confirmações para suas crenças, logo logo, não teremos mais um “baunilha apimentado” mas sim, um “BDSM abaunilhado” onde cada “tribinho” faz o que quer, do jeito que quer e não nos importaremos mais com o todo, com a comunidade!
No final do dia, como diz meu querido amigo se redação, Dr Psi, “o golpe tá aí! Cai quem quer”!
Se você vem pro lado de cá, cheio de certezas, e buscará somente as fontes que irão validar as vozes da tua cabeça, com certeza eu posso te dizer, você provavelmente nunca conseguirá o prazer de viver uma relação vertical de verdade! E lá na frente, quando tudo ficar pesado (por que vai!), você vai virar as costas e dizer que o BDSM não é para você!
E talvez não seja mesmo!
Porque o BDSM é um constante estado de ressignificação. Quanto mais agarrado aos seus vieses você estiver, menos você conseguirá ressignificar!
Então danadinhos, eu recomendo que, a partir de hoje, vocês se dêem a oportunidade de escutar e tentar entender aqueles que falam exatamente ao contrário do que você “chegou acreditando”! Eu posso quase te garantir que é exatamente nesse lugar que você vai encontrar o BDSM!
Por agora é isso!
Espero que todos tenham uma excelente semana e nos vemos semana que vem!
Hidratem-se!
E procurem ficar em casa por agora!
Abraços
Sra Storm
AUTORA: SRA STORM
Chef de cozinha e empreendedora da área de alimentos e no BDSM Top dedicada às práticas de Wax Play, Flogging, Branding, Castidade e Inversão e algumas outras pequenas perversões!
Instagram: @darkroomcla com conteúdo instrutivo da subcultura Kink e BDSM.
SUBMISSÃO SIM, SUSERVIÊNCIA NUNCA!
SER DISSIDENTE É SER RESISTENTE
COMUNICAÇÃO NÃO VIOLENTA NO BDSM
FETICHE DO VOYEURISMO E FETICHE DO EXIBICIONISMO
CONVERSAÇÃO, NEGOCIAÇÃO E CONTRATO
ABUSOS! PRECISAMOS FALAR SOBRE
SÍMBOLOS – LEATHER E BDSM
FETICHES, PARAFILIAS & TRANSTORNOS DE PARAFILIAS
SAFEWORD – A CONTÍNUA NUVEM CINZA!
BISSEXUALIDADE E PANSEXUALIDADE X BDSM
POSIÇÕES: TOP, BOTTOM E SWITCHER
OUTUBRO ROSA – ESSE PROBLEMA TAMBÉM TE PERTENCE?
FETICHE X CAPITALISMO – ENTENDENDO O DESEJO DE TER!
CASTIDADE
SUB SPACE
CONTRATO BDSM – MODELO EM ANEXO
Respostas de 2
Mais uma reflexão muito pertinente, bem embasada pela Sra. Storm a partir de argumentos sólidos.
A vida é as relações interpessoais são dinâmicas, porém as bases do conhecimento precisam ser sólidas. Há conceitos fundamentais que precisam ser compreendidos, e considero esse o grande mal da humanidade atualmente. Ninguém tem paciência para aprender, ler, e se apropriar do conhecimento. Com isso caminhamos para uma era em que aqueles que detém o conhecimento são taxados de arrogantes. O imediatismo tomou conta, porém, como citado no texto, cobra o seu preço cedo ou tarde.
Uma mentira contada mil vezes se torna uma verdade, infelizmente.
Felizmente há ainda algumas poucas pessoas que não compactuam desta posição e trazem um sopro de lucidez às nossas vidas. Muito obrigado Sra. Storm, muito obrigado Dom Barbudo!
Que reflexão perfeita Sra!