Na semana passada plantei a semente da discórdia e sai correndo. Quando eu falei que eu iria citar o BDSM virtual, as sessões virtuais de BDSM recebi uma verdadeira aula da Sra. Storm sobre o tema. É impossível eu não vir aqui e reafirmar mais uma vez que eu sempre disse, mas o nosso cérebro aprende por repetição, então o tio vai falar de novo.
Vale lembrar que eu faço parte do BDSM gay e existe uma “pequena diferença” entre a política do BDSM gay para o BDSM hétero que vai além de saber o gênero da pessoa que está ali na cena contigo. Nesta semana, a Sra Storm postou um texto magnífico sobre BDSM virtual levantando todos os perigos que podem acarretar quando, por impulso, nos jogamos em uma relação que não conhecemos bem.
Uma vez alertado todos os perigos no texto dela, vamos ao puxão de orelha do tio Psi! Cansamos de escrever aqui sobre a necessidade de um contrato, de um estabelecimento entre as partes, de uma conversa franca e racional entre os dois lados, para assegurar tudo que um BDSM consciente que pregamos aqui. Como, em sã consciência entramos em uma relação online com um Top que mal conhecemos.
Em algum lugar aqui eu já escrevi sobre a necessidade de conhecermos a pessoa que está ali à nossa frente. Quando temos uma noção de um BDSM saudável, apenas de conversar com uma pessoa por mensagem já conseguimos ter um alerta de como será aquela relação. Embora todo o tesão e o prazer envolvido em uma primeira conversa com um Top, temos que ter um pezinho na realidade e observar alguns pontos muito importantes: O quanto aquele Top quer entender sobre você, sobre seus gostos, sobre seus limites? Se vier com aquele discurso de que “o mestre manda e o submisso obedece” corre. Corre o mais rápido que você puder que as chances de você cair em um relacionamento abusivo, tóxico, um relacionamento que vai levantar gatilhos e instaurar o pior do que o BDSM tem a oferecer.
Acredito que as sessões a distância podem ser uma boa alternativa para quando temos uma DS com um Top que mora em outra cidade/estado. Comandos a distância, onde as regras e demandas que o Botton tem que cumprir ao longo do dia/semana muitas vezes são combinadas anteriormente por mensagem ou por chamada de vídeo/voz.
Até então ok, mas para termos uma relação virtual saudável é imprescindível eu ter uma confiança na outra pessoa ainda maior do que eu tenho quando a pessoa está ali na minha frente. Tudo tem que ser ordenado anteriormente. O contrato, o estabelecimento de uma sessão, a racionalidade, o bom senso deve estar sempre ali, do mesmo jeito que fazemos em uma sessão presencial. Se um “Top” quer ver uma Botton se flagelando até sangrar pela webcam, é muito mais proveitoso ver um vídeo no X-Videos ou em qualquer outro site que contenham vídeos BDSM.
Acredito que temos que ter uma atenção especial quando falamos de sessão online em relação as práticas. Quais práticas nós conseguimos praticar sozinhos? A distância? Temos que levar em consideração que muitas vezes não estamos nem em um ambiente adequado para tal, não vamos ter ajuda, o tão necessário aftercare. Porque eu vou me sujeitar a uma sessão virtual com práticas que me ferem (seja física ou psicologicamente) se, eu não tenho uma pessoa, ali para me guiar, me orientar? Esta é a função do verdadeiro Top: guiar, orientar, dar limites e auxiliar o Botton a dar e a sentir prazer. Não aceitem nada menos que isso. Nada menos que isso é um mero abuso e, sinceramente, não precisamos do BDSM para isso. As relações pessoais já fazem isso por si só. Se for só para mandar, para dar ordens que as vezes não podemos cumprir, não precisamos de BDSM, podemos ter isso em trabalhos tóxicos, em relações familiares distorcidas que se encontram em qualquer esquina. Entramos pseudodominadores em qualquer esquina, em qualquer aplicativo, em qualquer canto.
Precisamos no BDSM de bom-senso, empatia (que é diferente de altruísmo, já falamos disso no texto sobre alienação consciente), precisamos saber o mínimo. Não preciso saber línguas, ter acessórios de couro que custam uma pequena fortuna, diversos acessórios, metros de corda de navio que vieram da Austrália carregado por Monges Tibetanos Submissos que andam com cinto de castidade há 27 anos. Precisamos de bom senso, boa vontade, empatia, autoconhecimento. Eu preciso me conhecer, tanto como Top, tanto como Botton. Preciso conhecer a pessoa que está ali na minha frente, não preciso saber seus demônios, mas tenho que respeitar que estes demônios existem, como existem em todos nós. Preciso conhecer os limites desta pessoa, o que dá tesão, o que dá não dá, até onde ela pode ir.
É por isso que escrevemos aqui! Para passar o mínimo que conhecemos, para mostrar o certo diante do não certo, o saudável diante do doentio, o empático diante do orgulho, o que é lícito diante do que é ilegal.
Se persistirem os sintomas, procure o terapeuta mais próximo.
AUTOR: DR PSI
Psicólogo, especialista em terapia cognitivo-comportamental, psicopedagogia clínico e institucional e atualmente especializando em neurospicologia. Sempre fui interessado no mundo do BDSM, com a primeira experiência por volta dos 19 anos. Atualmente interessado em disseminar esta cultura em seus diferentes aspectos e as influências psicologias que estão atreladas.
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Uma resposta
Perfeita reflexão! Acredito que o BDSM é um complemento da vida adulta (para quem curte), e que deve ser buscado de forma saudável, por pessoas que são mentalmente sãs, para que possam se divertir. Quem busca o BDSM para resolver algum problema tem muitas chances de piorar sua situação, seja se submetendo a práticas insalubres ou submetendo o outro. E nada melhor do que conversar e alinhar as expectativas e chegar a um denominador comum antes de partir pra prática.