Antes de falar sobre submissão e feminismo preciso contextualizar de onde partem as ideias que vou desenvolver mais adiante. Para tanto, começo explicando de que conceito de BDSM pretendo tratar neste texto. Podemos explicar o BDSM a partir de alguns vieses, mas sempre que formos responder “o que é BDSM?” faz-se necessário saber que pergunta estamos querendo responder: 1. Significado do termo BDSM; 2. Significado do movimento BDSM; ou 3. Significado da prática BDSM.
No primeiro caso, se alguém quer saber apenas o que significa a sigla BDSM, podemos descrever as letras que compõem o acrônimo (bondage, disciplina, dominação, submissão, sadismo e masoquismo) e explicar ao que se refere cada uma delas. No segundo caso, se nosso interlocutor deseja conhecer o contexto do nascimento do BDSM, podemos remontar os fatos históricos para explicar o surgimento do movimento de contracultura sexual. E no último caso, se a indagação é acerca do que é o BDSM na prática, podemos responder que trata-se de um jogo lúdico baseado na criação de um universo mental com o propósito de alimentar nossas fantasias e desejos com o objetivo de saciar nossa libido.
Para explicar a submissão e mostrar como ela caminha paralelamente ao feminismo, eu parto desse último conceito de BDSM, o BDSM enquanto jogo lúdico. A submissão de que trato aqui é uma performance que se materializa na criação de uma persona sexual submissa que tem como única função obter prazer. A submissão que performamos só é real dentro do jogo que combinamos com os outros jogadores e nada tem a ver com situações cruéis e desiguais pelas quais muitas mulheres são obrigadas a passar cotidianamente, como poderia ser o caso de uma mulher desempregada, com filho pequeno e que se submete aos desmandos de um marido violento, por não ter condições de alimentar o próprio filho sozinha.
Ao contrário do exemplo mencionado, onde não há liberdade de escolha para se sujeitar a humilhações, na submissão BDSM, a humilhação pode ser desejada como forma de se chegar ao orgasmo, porém, a diferença está no fato de que aqui submissas e submissos são livres para escolher como querem vivenciar essa submissão. Acordos são criados, limites são estabelecidos e um universo totalmente paralelo é forjado para vivenciarmos todo esse jogo.
Como mulher, no meu dia a dia, luto pela igualdade de direitos e deveres entre homens e mulheres, por condições de trabalho e salários iguais, por leis que protejam a mulher em situações de vulnerabilidade e nunca vou cruzar os braços diante de uma mulher que esteja sendo submetida a qualquer tipo de relação violenta ou abusiva. E, assim como o consentimento e os acordos são os elementos que separam uma prática BDSM de uma violência, são esses mesmos itens que separam a submissão lúdica (desejada) da submissão real (não desejada).
Eu não escolhi a forma como minha mente chega ao prazer, eu não escolhi gostar de ser submissa, mas eu escolhi, assim como outras submissas e outros submissos, que eu gostaria de vivenciar isso que me dá muito tesão de uma forma segura e saudável para mim e meus parceires. Ao entender que essa necessidade de viver a submissão é apenas a exteriorização da minha sexualidade, entendi que ela não me oprime enquanto mulher. E é por isso que sou categórica em afirmar que submissão e feminismo podem conviver harmoniosamente dentro de todes.
Ser uma submissa no BDSM em busca de atender às minhas pulsões de libido me fez perceber que esse é um grande ato feminista. Eu me apropriei da minha liberdade de escolha, da minha liberdade de ser eu mesma e do meu direito de viver minha sexualidade, tal qual aos homens há tempos é permitido. E, como alguém livre para ser aquilo que faz parte da minha essência, não preciso atender a qualquer expectativa ou convenção social.
Estamos acostumados a atender uma necessidade social de nos encaixar em determinados estereótipos, mas esse é um dos elementos que o BDSM contracultural tenta desconstruir. Não é sobre ter que estar na caixinha do feminismo ou ter que estar na caixinha da submissão. Como tentei explicar nesse texto, existem outras nuances, outras complexidades, outras subjetividades e muitas formas de olhar para uma pessoa, para um termo, para um contexto, e tudo isso precisa ser levado em consideração ao falarmos em seres humanos, emoções e desejos.
Portanto, por mais que o senso comum concentre seus ditames no ideal de que feminismo e submissão não dialogam, se nos permitirmos ler além do prefácio desta história, veremos que o feminismo e o BDSM, enquanto movimentos políticos que pregam a igualdade e a liberdade, têm muito mais em comum do que o estereótipo pode nos mostrar.
Neste 24/7 desejo que você abandone seus conflitos internos e entenda que não é preciso escolher entre feminismo e submissão. Desejo, além disso, que você, mulher, tome posse dos seus desejos e seja a feminista que se ajoelha para a sua própria libido.
FELIZ 24/7! FELIZ DIA INTERNACIONAL DO BDSM!
Com carinho,
Bela.
AUTORA
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