Nos meus primeiros contatos com integrantes da comunidade BDSM, uma frase que eu escutava bastante era: “BDSM é um estilo de vida”. Isso me soava litúrgico demais, fantasioso demais e, portanto, irreal demais!
Esse pensamento vinha de uma leitura dessa frase como se a pessoa estivesse dizendo que vivia dentro de um personagem o tempo todo e isso pra mim não fazia sentido, porque eu não acredito que isso seja possível e muito menos saudável. E há realmente quem profira essa frase querendo significá-la dessa maneira, mas com o tempo e aprendizado, fui dando um outro sentido pra ela.
Eu posso dizer que existe uma grande linha divisória na minha vida que separa quem eu era antes e depois do BDSM. E aqui eu não me refiro apenas a questões sexuais, de prazeres e de libido. Conhecer o SubMundo me fez aprender uma das coisas mais valiosas da vida: comunicar! O diálogo, a comunicação transparente, a confissão honesta e clara, a abertura pra falar aquilo que me incomoda, aquilo que eu desejo mudaram a minha forma de me relacionar com o mundo e com as pessoas dentro e fora do BDSM.
Pautar relações sem joguinhos, sem mentiras ou tentando ser aquilo que não sou parecia muito distante até que eu cruzasse esse mundo dos ‘prazeres perigosos’. Mas veja bem, com isso eu não quero dizer que por aqui só existam pessoas éticas. Isso seria maravilhoso, mas, infelizmente, nenhum ambiente está livre de pessoas mal intencionadas e sem caráter. O que quero dizer é que o BDSM baseado nas premissas da negociação, limites e aftercare, nos possibilita aprender a lidar com pessoas e situações de forma responsável, ética e empática.
Com a negociação temos a primeira grande lição que é comunicar o que somos, quem somos, o que gostamos, como gostamos, o que esperamos, o que não queremos, o que nos alimenta, o que nos frustra, tudo isso livre de julgamentos e de uma moral cerceadora.
Ao combinar uma palavra de segurança aprendemos a impor limites e a respeitar os limites alheios para que as relações ocorram da forma mais saudável possível, evitando ‘cicatrizes’ físicas e emocionais difíceis de superar.
Com o aftercare vem uma lição que ajuda muito em quase todos os momentos da vida que é “colocar-se no lugar do outro”. É o momento de exercitar a empatia e dar ao outro aquilo que ele ou ela precisa para estar bem.
Esses conceitos, no entanto, não deveriam ser exclusivos do BDSM e sim fazer parte de todas as nossas ações no cotidiano normalizado, porém, eles foram introduzidos no BDSM para mostrar àqueles que viam seus praticantes como doentes pervertidos, como pessoas idôneas e éticas que só queriam viver seus prazeres sem causar danos a ninguém. Acontece que esses valores foram se perdendo no mundo baunilha, enquanto no SubMundo, por tirarmos prazer de jogos de risco, esses valores foram tornando-se cada vez mais importantes.
Aliado a isso, o BDSM faz com que iniciemos uma jornada de autoconhecimento e autoaceitação. Isso pode parecer um tanto clichê, mas a verdade é que poucos chegam aqui tendo total consciência acerca da sua persona sexual. É uma realidade totalmente nova que se apresenta e precisamos descobrir quem somos, como funcionamos nesse novo cenário e aceitar que esse universo que nos atrai e mexe com nosso imaginário não nos torna errados, apesar de não sermos compreendidos por todos. Mas, uma vez que nos propomos a nos conhecer e a mergulhar nos nossos desejos mais íntimos, esse é um ganho que vamos carregar para toda a vida.
O BDSM para mim além de um movimento contracultural que se propõe a quebrar paradigmas na busca de reconhecimento de formas não convencionais de se obter prazer, é também um norteador na construção de relações responsáveis.
Eu levei todo o aprendizado que obtive no SubMundo para todos os âmbitos da minha vida e não consigo imaginar nenhum relacionamento interpessoal que não passe por diálogos francos e por respeito aos meus limites e aos limites do outro.
Então, se alguém hoje me perguntar se BDSM é um estilo de vida, eu digo que se você entendeu direitinho sobre o que é o BDSM, sim, ele é um estilo de vida que eu tenho orgulho de propagar no meu cotidiano.
Com carinho,
Bela.
AUTORA
Quem nos conduz nessa jornada pelo SubMundo é Belarina.
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Uma resposta
Muito bom! Realmente o texto faz pensar. Não tinha parado pra analisar desta forma, mas a bela tem razão. O que pode haver de mais difícil do que revelar seus fetiches mais íntimos? Depois de transpor esta barreira toda a comunicação se torna mais fácil. Olhando pra trás agora consigo enxergar isso na minha vida depois que me “assumi” BDSMer…