O que são e porque são coisas distintas?
Surgimento do FEMDOM e do MALEDOM no BDSM – Embora possamos ter relatos de Mistress (FEMDOM) já no meado do século XIX, somente por volta no fim dos anos 1960 aparece realmente o termo FEMDOM.
Já os MALEDOM, existiam na cultura Leather homossexual já a algum tempo, provavelmente a partir de meado dos anos 1950.
MALEDOM é Dominação Masculina, e isto nasceu dentro do contexto homossexual no exército americano no fim dos anos 1940, inserido no conceito de Disciplina (que se tornará posteriormente uma das letras da sigla BDSM). Este conceito unido ao Bondage, evoluiu nos clubes Leather durante os anos 1950, se tornando uma identificação dentro da futura comunidade BDSM.
Nos anos de 1960 o conceito de MALEDOM deixou de ser exclusivo da comunidade Leather Homossexual para ser transferido a relações também hetero ou mistas.
No fim dos anos 1960 algumas Dominadoras engajadas socialmente e próximas da Comunidade Leather, pertencentes a primeira Comunidade BDSM, se identificaram dentro do contexto da Supremacia Feminina, criando o FEMDOM.
Aqui começam as grandes diferenças para duas nomenclaturas aparentemente similares.
Enquanto o MALEDOM pode ser exercido entre pessoas do mesmo gênero sexual ou de gênero sexual diferente, o FEMDOM somente pode existir entre uma Mistress e um bottom masculino.
Nos primórdios, não sendo estabelecido o conceito de relação D/s, mas somente o conceito de SM, o MALEDOM disciplinava tantos homens como mulheres afirmando a própria capacidade de ser Dominante Masculino e, o FEMDOM somente homens afirmando a Supremacia Feminina.
Os contextos ideológicos são então, bem distintos e ligados a conceitos diferentes.
No contexto do MALEDOM é uma afirmação de Masculinidade que exercida dentro de uma relação (homossexual ou não) estabelece com clareza uma posição de dominância do masculino versus o feminino (independente da classificação e gênero).
No contexto do FEMDOM, em jogo está a afirmação de que a Mulher (neste âmbito) é superior ao homem, dominando-o e estabelecendo sua hierarquia e poder em contraposição a retorica machista.
A partir destes e outros conceitos, aqui trascurados pois não pertinentes a este texto, estabeleceu-se o conceito de Dominação e submissão (a D/s).
Neste momento (fim dos anos 1980 início dos anos 1990), o componente heterossexual entra em peso na Comunidade BDSM começando a estabelecer novas identidades, nasce então de modo mais formal o MALEDOM heterossexual.
Junto com esta entrada de novas pessoas, também aumenta o recurso ao Role Play Game (Jogo de interpretação) no qual as partes envolvidas procuram estabelecer mais regras dos papéis interpretados no jogo, em particular entre Dominador masculino e submissa feminina.
De fato, este universo é o que hoje tem mais regras, condições necessárias para atuar no papel e conformismo social.
Ao longo dos últimos anos, e no período do lançamento de 50 Tons de Cinza, muita mais atenção foi dada à cultura BDSM, especialmente na relação Dominador masculino/submissa feminina. O problema com tudo isso, não é a luz mostrada sobre a cultura, mas que o livro infantiliza o protagonismo feminino, cria uma fantasia de abuso entre as donas de casa e zomba da cultura BDSM.
A cultura do BDSM se concentra em um mundo de adultos que jogam em uma experiencia onde a base fundamental é o SSC, onde por meio do consentimento pleno praticam um comportamento sexual a-normativo, a fim de alcançar mutuamente gratificação sexual.
Os livros e os filmes não têm esse centro, e não fornecem esta imagem, deixando perceber de forma romantizada a exploração das fraquezas da parte submissa feminina.
Para os praticantes de BDSM, o mundo de hoje é tão livre quanto para qualquer comunidade minoritária. Com o advento das informações online por meio da internet, a cultura BDSM foi disseminada, se tornou menos fechada, mais disponível, mais flexível.
Muitas pessoas e muitos casais heterossexuais começaram a tentar experimentar fetiches ligados ao BDSM, uma grande parte de casais “normais=normatizados”, nos últimos anos praticaram alguma coisa, tentaram reavivar a própria relação sexual por meio de fetiches ligados de alguma forma ao BDSM.
Podemos afirmar que o BDSM atingiu, mesmo se de forma as vezes superficial, o nicho de casais tradicionais mais aventureiros e com tendências fetichistas.
Isto obviamente não significa que estas pessoas estejam vivendo o BDSM, pois o BDSM é uma comunidade real, feita de pessoas reais que se encontram, e convivem dentro de uma mesma subcultura, sem preconceitos de escolha sexual ou de gênero.
A partir deste momento histórico, 2011, surgem novos MALEDOM, que são exclusivamente dedicados a relação D/s com submissas femininas. Até aqui tudo bem, escolha de cada um a respeito da própria sexualidade e desejos.
O que ocorre é que alguns (afortunadamente não todos) deste novo MALEDOM esqueceram ou ignoram a origem do BDSM, suas bases primordiais e o que faz de alguém membro de uma comunidade de subcultura.
Algumas destas pessoas são homofóbicas, acham que a mulher (não somente as submissas) são seres inferiores, que os submissos masculinos são frouxos e desprezíveis, que as Dominadoras femininas são uma praga.
As atitudes destas pessoas variam da indiferença e desinteresse em conhecer mais, até a aberta manifestação de desgosto. Algumas vezes se erguem a profundos conhecedores da comunidade pontificando regras que nunca foram aceitas pela própria comunidade a qual eles também nunca pertenceram.
É sabido que homens inseguros são facilmente intimidados por mulheres fortes. Dominantes inseguros do sexo masculino agem com rejeição às Dominadoras: evasão, desrespeito e tentativas de empurrar a insegurança e o desconforto para os outros.
Isto porque talvez eles tenham seu próprio lado submisso, mas carecem da força interior para se libertar das expectativas da sociedade e admitir o próprio desejo. Por isto talvez eles menosprezem homens submissos, por possuírem a força que lhes falta. Eu conheci tanto no mundo real como no virtual um bom número desses homens, que são, na verdade, bastante comuns.
São atraídos pelo BDSM porque têm desejos e fantasias, mas são inseguros e fracos demais para se aceitarem, e as normas sociais determinam que eles devem ser Dominantes, porque são homens. Eles então se encaixam neste molde, continuando a cultivar sentimentos baunilha como ciúmes (que vem da insegurança), controle sobre a mulher (que se deixada livre poderia trai-lo), etc.
Estas pessoas que se intitulam de MALEDOM, mas seria mais apropriado eles se intitularem como MACHISTADOM, de fato são somente machistas. Eles existem desde sempre e praticam a submissão feminina, com diferentes graus de consentimento (ou abuso) da mulher desde sempre.
Estas pessoas, não pertencem a comunidade BDSM. Não pertencem hoje, nem pertencerão amanhã, pois entre os princípios de nossa comunidade está o abandono dos estereótipos baunilha, dos preconceitos para com as práticas e sexualidade dos outros, da paridade absoluta entre homens e mulheres, e que sempre tudo aconteça dentro do combinado de forma consensual no âmbito do SSC.
O MALEDOM real (homossexual ou não), é livre de preconceitos, zela pelo bem-estar e pelo prazer da pessoa dominada. Sendo ele o condutor da relação, é de sua responsabilidade assegurar que o submisso(a) ou escravo(a) alcance a própria satisfação dentro da relação de forma livre e prazerosa. É dever dele, proteger o bottom tanto do ponto de vista físico, como emocional e psicológico. É dever dele incentivar e permitir o crescimento do bottom tanto na vida baunilha como no meio BDSM.
Já na vertente do FEMDOM também tivemos mudanças e divergências.
Em vários estudos sobre o comportamento sexual tanto na Europa como nos EUA, emerge claramente que uma boa parcela de mulheres prefere o homem submisso. Isto é visível até em comportamentos sociais não necessariamente ligados à sexualidade. É o famoso: “É ela quem manda em casa”. Várias pesquisas revelam que cerca de 30% dos homens se identificam de alguma forma como submissos à mulher, esposa, parceira.
Muitos deles, porém, pensam que submissão seja sinônimo de feminilidade e que feminilidade seja sinônimo de inferioridade, então que submissão seja igual a inferioridade, e ficam desconfortáveis e frustrados com a ideia de que um homem submisso possa ser mais forte do que eles, então escolhem mudar sua natureza para proteger o próprio ego e poder ver o submisso como um homem muito fraco.
Apesar destes pensamentos, frequentemente, este tipo de homens procura uma mulher forte que os domine, as vezes somente por algumas horas, antes de continuar a própria vida baunilha dominada pelos estereótipos.
É neste contexto que o FEMDOM atua, exercendo poder sobre o homem hetero, afirmando a supremacia feminina por meio da feminização forçada, humilhação, ballbusting, CBT, etc.
A ideologia do FEMDOM deriva diretamente das ideias utópicas (e ao meu ver discutíveis) de Andrea Dworkin, Monique Wittig e Mary Daly que no fim dos anos 1960 e meados de 1970 defendiam uma ideia de sociedade em que as mulheres governassem como seres superiores, pois “Se as mulheres liderarem o governo, há uma chance muito maior de que não haverá guerras, e que os problemas sociais serão resolvidos. Os homens pensam com seus pênis. Eles são facilmente manipulados.”
De acordo com Sue Storm, que trabalhou como dominatrix profissional por quarenta anos, a maior parte da defesa da supremacia feminina online é “uma fachada”. “É tudo para ganhar dinheiro”, disse. “De todas as mulheres que dizem ser supremacistas femininas, apenas dois a três por cento realmente o são. É óbvio que os homens ainda agem como animais por causa da testosterona. Toda a irmandade FEMDOM é um lixo. Nós não evoluímos o suficiente”, disse ela, observando que o aumento da dominação financeira, ou “FinDOM”, levou as dommes mais jovens a adotarem personagens falsos de supremacistas femininas, a fim de atrair submissos dispostos a esbanjá-las com presentes e dinheiro. “A maioria das mulheres que entram nesse negócio está fazendo isso por dinheiro rápido, então há muitas brigas internas. É raro ver duas mulheres que não estão brigando. Como esse comportamento pode ser supremo?”
No decorrer dos anos, as FEMDOM, mesmo continuando na ideologia da supremacia feminina, em sua grande maioria, participando da comunidade BDSM aceitaram as diferenças, os Dominadores masculinos, as submissas.
O movimento FEMDOM, enfim rachou.
Uma vertente continuou no seu percurso supremacista puro, contra os homens, outra vertente se aproximou da comunidade BDSM e começou a frequentar outros BDSMers com respeito.
A vertente supremacista pura não aceita as FEMDOM trans, não aceita os Dominadores homens e não respeita os bottoms, sejam eles masculinos ou femininos (por motivos diferentes). A componente FEMDOM radical, continua desrespeitando os homens em todas suas posições (TOP e bottom), as submissas, e continua sendo transfobica.
A outra vertente, mantendo o conceito da supremacia feminina aceita o relacionamento de TOP para TOP com homens, respeita os bottom sejam eles homens, mulheres, trans e aceita também Dominadoras Trans entre as FEMDOM, reconhecendo então que a identidade de gênero não é genética.
Esta vertente ganhou mais relevância no FEMDOM a partir de 2013 pela ação de uma FEMDOM Trans, Domina Jen, que publicou o artigo “Por que não acredito mais na supremacia feminina”, no qual ela expressou serias dúvidas e reservas a este movimento. Embora ela ainda acredite que “as mulheres são biológicas e fisicamente superiores aos homens”, ela escreveu, não se sente à vontade para fazer generalizações. “Não quero respeito só porque sou mulher”, escreveu ela. “Isso parece falso e vazio. Quero ser respeitada por causa de minhas ações, por causa de quem eu sou. Existem inúmeras mulheres que são de vontade fraca, mente fraca, egoísta e cruel. Conheço muitas mulheres que não merecem nenhum tipo de respeito. E a ideia de que essas mulheres estão no comando de algo ou alguém é aterrorizante. ”
“Se eu acho que as mulheres precisam subir ao poder? 100 por cento. Eu acho que somos supremas acima de todos os outros? Absolutamente não.”
Esta nova vertente do FEMDOM também questiona a consensualidade no FEMDOM extremista: Como pode haver consensualidade se uma parte não respeita a outra?
A partir deste movimento novo, as FEMDOM foram mais aceitas na Comunidade BDSM e exercem seu papel de supremacia e dominância com respeito ao SSC e aos outros participantes da própria comunidade.
Este são FEMDOM e MALEDOM…
Nada a ver com o imaginário que alguns fazem circular por aí na internet tupiniquim…
AUTOR
Sr. Jack Napier
Artesão em couro por hobby e por paixão, empreendedor no setor de acessórios fetichistas e BDSM, livre pensador, TOP com predileção à perda da zona de conforto do bottom por meio de práticas variadas, desde o spanking, ao chemical play, tortura, asfixia.
Criador da marca BDSM Luxury.
Dono da harleen
Instagram :
SITE DA LOJA: www.bdsmluxury.com.br
Respostas de 7
Leitura muito interessante, há várias informações históricas que eu não conhecia. Muito obrigado pela publicação!
Nossa, que lícito. Você é muito inteligente.
Falo isso porque eu também tenho diário virtual e poucas vezes alcancei deter o visitante assim.
tem bastante plumitivo bom e você é um deles. Agradeço a web por me
conceder a oportunidade de conhecer seu sítio da
Internet e também conseguir regressar.
Muito obrigado pela sua postagem!
Seja muito bem vinda.
Abraço,
Dom Barbudo
Sabor da farma nos quais você se posiciona.
Parabéns pela forma simples e também clara que você usa a termo certa.
Ainda bem que conheci seu sítio, verdadeiramente é
bastante bom a forma que você escreve. Gostei.
Realmente sua teoria é muito boa. Espero da mesma forma
você escreva continuamente porque eu prosseguirei regressar cá.
Isso quer dizer que uma Domme, com posse feminina, não seria Femdom? Seria o que?